Jovem negro de bairro perifĆ©rico, muitas das vezes esquecido pelo poder pĆŗblico e vĆtima das mĆ”culas impostas pela sociedade. Poderia se deixar levar pelas tentaƧƵes da ?vida fĆ”cil?, como muitas vezes acontece, mas quis o destino que ele fizesse diferente. ?Meu caminho pelo mundo eu mesmo traƧo?, disse o poeta Gilberto Gil em certa canĆ§Ć£o.Ā E CaĆque seguiu Ć risca as liƧƵes do velho poeta.
KaĆke Ć© um dos contemplados com uma bolsa integral do Programa Universidade para Todos (Prouni). Cursa o primeiro semestre de Medicina na Universidade Salvador (Unifacs). Mas como jĆ” foi dito, nada veio de mĆ£o beijada para o futuro mĆ©dico. Por ser filho de industrial, KaĆke teve o dirieito de cursar o ensino fundamental na rede SESI. Estudou no ColĆ©gio Comendador Bernardo Martins Catharino. ?LĆ” tinha um preƧo acessĆvel para que meus pais pudessem pagar. O colĆ©gio era lĆ” na Ribeira. ?Eu saĆa cedo de manhĆ£, em torno de 5h40… 5h50… E foi assim… No inĆcio meus pais foram me levar e depois eu comecei a ir sĆ³?, lembra o jovem. Ao final da oitava sĆ©rie, em 2012, ele ingressou no ensino mĆ©dio. Passou a estudar no colĆ©gio Djalma Pessoa, em PiatĆ£. ?No ensino mĆ©dio me tornei bolsista integral pois eles disponibilizavam bolsas no ensino mĆ©dio para filhos de industrial. Isso tambĆ©m foi crucial para que eu pudesse estar agora cursando medicina na Unifacs?, conta.
ApĆ³s o tĆ©rmino do terceiro, o garoto ingressou em um curso de tĆ©cnico na rede Senai na Ć”rea de elĆ©trica, tambĆ©m de forma gratuita. O caminho era promissor, mas ainda nĆ£o era o que ele queria. Algo ainda o inquietava: a medicina. ?Sempre foi meu sonho estudar medicina. Desde pequeno todos os meus planos e tudo aquilo que eu me dedicava, todas as minhas abdicaƧƵes, muitas vezes com os recursos tendo que ser muito bem administrados, era nesse sentido?, explica o futuro ?doutor?. Persistente no seu objetivo, porĆ©m ciente das dificuldades a serem enfrentadas KaĆque seguiu firme. O jovem passou a estudar em casa. Pela tarde fazia o curso tĆ©cnico. JĆ” pela tarde e pela noite voltava aos livros de olho nas provas do vestibular e do Enem. ?Estudei por conta prĆ³pria pois nĆ£o tinha como pagar cursinho?, relembra. Em 2015 fez o Enem, mas nĆ£o obteve a pontuaĆ§Ć£o suficiente. ApĆ³s mais um ano seguindo a rotina de curso e estudo KaĆque logrou ĆŖxito em sua empreitada. ?Foi uma vitĆ³ria que se resumiu a vĆ”rios anos, nĆ£o foi uma coisa do momento, mas que refletiu em toda a minha histĆ³ria, todas as minhas lutas, dificuldade e tambĆ©m superaƧƵes. Sou bolsista do Prouni, meus pais jĆ” estĆ£o perto da terceira idade, e eu nĆ£o tinha como pagar uma faculdade de medicina?, comemora o obstinado rapaz.
Para aqueles que possuem uma histĆ³ria de vida parecida com a sua e de alguma forma alimentam algum tipo de sonho o garoto fala asa seguintes palavras: ?Penso que muitas vezes a representatividade importa. EntĆ£o Ć© importante que a gente divulgue, pois estamos numa comunidade onde o estigma ainda persiste. Devemos mostrar que Ć© possĆvel. Ć como sempre digo: O caminho talvez seja um pouco mais longo e Ć”rduo, mas nĆ£o Ć© impossĆvel. Outros desafios virĆ£o pela frente. Mas devemos sempre enfrentar. NĆ£o perca o sonho de ser quem vocĆŖ quer ser pela condiĆ§Ć£o social ou pelo estigma que Ć© perpetuado por muitos e muitos anos?.
Que desse exemplo faƧa surgir novos ?KaĆques? em nossa comunidade. ParabĆ©ns garoto!