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Pesquisa mapeia hábitos culturais no Brasil: Salvador é a cidade que mais lê

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Nem Claudia Leitte nem Ivete Sangalo. No quarto da estudante de ciências contábeis Maria Cecília Silva Cerqueira, de 18 anos, no bairro Santa Cruz, em Salvador, o que não faltam são livros de J.K.Rowling e Stephenie Meyer. Ler é sua atividade favorita. Aos 11 anos, ganhou de uma tia o primeiro livro da saga “Crepúsculo”. Não parou mais. Hoje, diz, não troca o silêncio de seu quarto de leitura por nenhuma festa popular. Nem na época do carnaval.

Pode até parecer um contrassenso para quem vive na capital do axé e do trio elétrico, mas não é. Uma pesquisa inédita realizada pela consultoria JLeiva Cultura & Esporte, em parceria com o Instituto Datafolha e apoio da Fundação Roberto Marinho, mostra que Salvador é a cidade que mais lê entre 12 capitais das cinco macrorregiões do país. O índice é de 72%, contra apenas 56% no outro extremo, Recife.

Surpreendentemente, apenas 25% dos moradores da capital da Bahia disseram ter ido, nos últimos 12 meses, a algum bloco de carnaval. O festejo mais popular da cidade, para surpresa de muitos, são os arraiais de junho. No “país do carnaval”, aliás, metade da população das 12 capitais afirma ter baixo interesse pelos blocos.

Os números da pesquisa “Cultura nas capitais” servem como diagnóstico para compreender, através de 14 hábitos como leitura e acesso a cinema, shows e festas populares, um universo de cerca de 33 milhões de pessoas. Desses, de acordo com a amostragem, mais de 30 milhões fizeram algum tipo de atividade, o que explicita o imenso potencial do mercado cultural no Brasil.

O instituto abordou mais de 10 mil pessoas acima de 12 anos entre 14 de junho e 27 de julho de 2017 com a seguinte pergunta: “o que você costuma fazer em seu tempo livre, quando não está trabalhando nem estudando?”.

EXCLUSÃO CULTURAL

Um livro com a íntegra e a análise de especialistas da pesquisa será lançado hoje, em São Paulo, na Pinacoteca, e no próximo dia 30, no Museu do Amanhã, no Rio. A publicação acontece em um momento de cortes orçamentários nos setores público e privado e de questionamentos sobre as leis de incentivo culturais em um contexto de crise econômica.

Em números gerais, a pesquisa apontou que a leitura de livros é a atividade cultural mais comum entre os brasileiros: 68% das pessoas leram ao menos uma obra literária no último ano. Em compensação, a exclusão cultural aparece ao se revelar que 15% dos entrevistados não tiveram acesso a livro algum, três em cada dez nunca foram a um museu e 37% não entraram no teatro.

— O acesso à cultura reflete a desigualdade no Brasil. A gestão cultural ainda é feita de forma bastante intuitiva. Precisamos desenvolver um olhar mais atento para o público, entender a forma pela qual ele se relaciona com as atividades culturais, como ele se aproxima e por que ele se afasta de teatros, museus e cinemas — diz João Leiva, organizador da pesquisa.

As variáveis que mais influenciam o acesso à cultura são a educação e a renda, nessa ordem. Nas classes D e E, 82% dos entrevistados nunca foram a um concerto musical. A renda é um fator considerável, mas não só. Os números mostram que 58% dos que têm apenas ensino fundamental jamais assistiram a uma peça — ambiente frequentado por 55% das pessoas com ensino superior.

O levantamento aponta outros contrastes. Mulheres, por exemplo, dizem ter mais interesse em cultura do que homens, mas o acesso é menor. Quanto maior a escolaridade, menor a diferença.

Nos grupos de renda e escolaridade similares, o acesso é quase o mesmo até a chegada dos filhos, o que evidencia um persistente desequilíbrio na divisão de tarefas domésticas. As mulheres que se declararam “donas de casa” vão menos a museu (15%) e teatro (13%) do que quem está — em todos os gêneros — desempregado (20% e 19%).

O Rio registra índices acima da média nacional em atividades relacionadas a leitura (69%), cinema (68%), shows (49%) e museus (37%). Na cidade, pasme, a pesquisa diz que mais gente declarou São João como a festa preferida, à frente do carnaval: 76% contra apenas 21%, número bem inferior ao registrado, por exemplo, em Recife (47%), a mais carnavalesca das capitais, de acordo com a pesquisa.

BELO HORIZONTE À FRENTE

Belo Horizonte se destaca em quase todos os quesitos, com os melhores percentuais de frequência. Uma das explicações é a proximidade de equipamentos culturais importantes na região da Savassi, segundo um dos frequentadores, o professor universitário Gilmar Pereira, 34, que se mudou de Juiz de Fora para a capital mineira há cinco anos.

— Um dos maiores complexos culturais do país se encontra na Praça da Liberdade, onde ficavam as antigas secretarias de governo que deram lugar a centros culturais e museus — diz Gilmar.

A pesquisa mostrou ainda que Belém se destaca tendo a maior frequência em apresentações de dança, como o carimbó. Na capital paraense, conta a cientista política Fhoutine Marie, 38, as danças mobilizam bairros e escolas em festas e concursos de quadrilhas apresentadas em espaços públicos.

Belenense, Fhoutine atualmente mora na Grande São Paulo. Frequenta apresentações de bandas alternativas na maior metrópole brasileira mas, curiosamente, só sai para dançar em casamentos — ou quando passa férias em sua antiga cidade.

DESTAQUES BRASIL AFORA:

Salvador: A capital que mais lê no país inteiro.

Belo Horizonte: Campeã em concertos de música clássica, museus e teatros.

Porto Alegre: Com maior número de salas/habitantes, é a cidade que mais vai ao cinema.

Fortaleza: Jogos eletrônicos aparecem como uma das atividades favoritas.

São Luís: À frente quando se trata de danças populares.

Recife: A capital foliona do país, mas a que menos lê.

Brasília: Número um entre os frequentadores de bibliotecas.

Os dados completos da pesquisa, realizada entre 14/6 e 27/7, estão disponíveis em culturanascapitais.com.br.

Jefferson Borges
Jefferson Borges
Publicitário, Ativista Social e Fundador do Portal NORDESTeuSOU.

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