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Sandoval Ferreira, a melodia que vem do Nordeste

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Quem teve o prazer de vivenciar o auge da música baiana, no final do anos 80 e início dos anos 90, e  nunca cantarolou esse hit de grande sucesso da banda Olodum? O autor dessa composição, Mel Mulher, e de tantas outras , é Sandoval Ferreira da Silva ou Sandoval Melodia, como é mais conhecido.

Nascido e criado no Nordeste de Amaralina, mais precisamente na rua José Rodrigues de Oliveira, antiga rua Ipanema, perto do campo do Areal, Sandoval é mais um daqueles que beberam na fonte abençoada de um dos bairros que mais frutos renderam para a música baiana. “Até hoje resido nesse bairro que eu tenho uma enorme paixão. Foi o Nordeste que me deu a arte. A arte de compor, de tocar e de cantar. Arte que aprendi com meus avós que eram apaixonados pelo samba”, costuma contar o moço que tem o samba reggae nas veias. O apelido foi dado pela facilidade em criar melodias. “Faço música fazendo um batuque na porta, na mesa de um bar ou na palma da mão. A música já vem pronta com melodia e letra. Agradeço Deus, esse ser invisível que me possui e me manda essas mensagens maravilhosas.

Melodia conta que seu primeiro contato, desde que “começou a se entender como gente”, foi com a música. Desde os sete anos já tocava e fazia samba para a galera. Onde tinha samba o garoto estava dentro. A brincadeira predileta não poderia ser outra: show de calouros. “Eu não tive infância como a de muitos jovens por aí. Sempre dediquei minha vida toda à música. Desde criança me dedico exclusivamente à música. A música é minha vida. Enquanto a galera estava jogando bola, outros indo ao cinema, eu estava ali na música. Ela está na minha alma.  Até hoje meu pai fala que se soubesse que ia me entregar à música desse jeito, ele tinha me ajudado mais nesse sentido”, explica.

Na adolescência ganhou o seu primeiro timbal e literalmente se apaixonou pela batida dos tambores e pelo Olodum. “Quando vi o Olodum pela primeira vez me encantei. Meus pais não deixavam eu ir ao Pelourinho, aliás naquela época, família nenhuma deixava os seus filhos irem para lá. Mas mesmo assim, eu dava uma fugida e ia ao Olodum”, lembra. Saudosista, Sandoval recorda do tempo em que se reunia com os amigos e iam para o Largo de Amaralina ou para o Jardim de Alan. Lá se juntavam com um único intuito: fazer música. Um outro hobby? Namorar e tomar uma gelada: “O que a gente não podia deixar de fazer também era namorar. À noite, tinha que curtir um love que também é massa. Se eu fosse num bar beber, tinha que rolar música. Gostava de tomar uma… (risos). Tinha a sexta-feira “consagrada” no bar do Júlio, na entrada da Sucupira. Era o fundo de quintal de primeira. Rolava Joventina Perola Negra, Ivone Lara, Zeca Pagodinho….Era o encontro dos amigos. Marcão Rasta, Julinho, Tatá (hoje na Timbalada), Missola, Tote Gira. Tinha os domingos no bar do Zé Milton… Não poderia deixar de lembrar do Bar Ponte da Inspiração, de Dinho Inspiração, na rua Brasil, onde foram feitas muitas das nossas composições. No sábado fazíamos um samba lá na Boca do Rio”.

Ainda garoto, o futuro cantor e compositor literalmente “foi para às ruas”, como ele mesmo costuma falar. A primeira oportunidade com instrumento foi no “Samba Vila”. Sandoval lembra que para ingressar no grupo, o mestre, que na época era Carlinhos, teve que ir falar com seus pais para pedir autorização para que ele tocasse no samba dele.  Ele mesmo conta: “Dali fui para o “Samba Pé”. Aqui no Nordeste ainda fiz parte do “Samba Pé”, “Samba Elite”, “Samba Natureza”, “Samba Charme”. Fui buscando mais conhecimento na música, mas tudo começou através de meus avós e meus pais. Foi Nordeste que busquei mais conhecimentos… Conheci Juca Maneiro, que é um dos meus parceiros principais, Sílvio Almeida, Claúdio Tavares… Foi que comecei a compor algumas coisas. Fazíamos essas composições a partir dos sambas juninos. Era uma coisa muito magica. Fazer uma música, naquela época, era uma coisa divinal”.

Do samba para o samba junino e posteriormente parte para a música afro. Depois de aprender a tocar os instrumentos de percussão Melodia se tornou diretor do “Samba Natureza”. Lá conheceu Marquinhos Show, com quem idealizou a banda “Magia Negra”,  banda dissidência do Olodum e considerada por Sandoval como “o início de tudo”. A área de canto da banda “Magia Negra” era composta por Sandoval Melodia, Xexéu (ex-Timbalada), Lula Novaes, Cinho Revolução e Sérgio Participação. “Essa banda fez um trabalho maravilhoso dentro do Nordeste de Amaralina. Era a melhor banda que tinha dentro do bairro. Viajamos muito, fizemos muitos shows… Mas aí se deu a saída de Xexéu… A música Beija-Flor, era da banda “Magia Negra”. “Nordeste sofrimento povo lutador”, muita gente pensa que fala do da região Nordeste, mas não é não. Fala do nosso bairro. Logo depois, eu e Lula Novaes, criamos a música Mel Mulher, também da “Magia Negra”. Essa música foi sucesso e acabou entrando no disco do Olodum, O Movimento. Com a saída de outros membros, eu e Marquinhos mudamos o nome da banda para “Swing Magia”, que até hoje sobrevive”, rememora.

Em 2000, a banda “Swing Magia” deu uma parada. Sandoval seguiu compondo e disputando festivais. Em 2001, foi campeão do Festival do Olodum com a música Soberano Rei. Daí não parou mais. De 2001 até 2017 foram treze títulos no Festival de Música do Olodum (Femadum). “Músicas que até hoje tocam. No Ilê Aiyê ganhamos seis vezes. No Malê de Balê, cinco vezes. Nunca parei. Tenho músicas gravas com a Banda Mel, Jammil e uma noites, Afrodisiaco, Terra Samba, Cheiro de Amor, Tonho Matéria…No quesito composição o Nordeste de Amaralina é o bairro que mais ganhou festival ”, frisa Melodia.

Em 2001 foi convidado a fazer parte da banda “Kissukilas”: “ Era um samba merengueado com músicos consagrados de Elba Ramalho, Geraldo Azevedo…” No “Kissukilas” ficou por três anos. Em paralelo, tocava o “Swing Magia”. Posteriormente foi convidado para o bloco afro “Os Negões” e lá está até hoje. Com “Os Negões” teve a oportunidade de conhecer três países. “Tive em Bogotá, nos Estados Unidos e em Buenos Aires num festival de samba reggae”, pontua.

GRATIDÃO – Em relação ao povo do Nordeste de Amaralina Sandoval diz que o carinho reciproco: “Se o povo daqui pudesse me botava até no programa do Faustão (risos). Muitas amizades boas… Hoje sou querido por todos dentro do bairro. Se você chegar no Nordeste e perguntar por Sandoval Melodia parece ate brincadeira… Sou um cara que procuro sempre fazer amizade, respeitar, que é o principal de tudo, e também dar o seu carinho e sua contribuição. Toco em eventos e aniversários aqui no bairro. É uma relação de amor e respeito. Eu amo meu bairro, minha favela, meu guetho. Todo festival que eu ganho , eu faço referência ao meu bairro”.

O carnaval 2018 será no Swing Magia, “o início de tudo”, onde tocará pela terceira vez no circuito Mestre Bimba.  O tema será “O Nordeste é África da cabeça aos pés”. “Vamos reverenciar os líderes: Mandela, Luther King, Mestre Bimba… Teremos vários convidados. Serão 50 percussionistas de várias entidades: Ilê, Olodum, Malê… Vamos levar a poesia, a paz e o amor para as ruas”.

“Nesse seu de poesias /  Letras são estrelas/ Já mandei flores pra você / Para poder te conquistar

/ O som do tambor que vai dizer”. Evoé, Sandoval!

Principais composições de Sandoval Melodia:

Mel Mulher 1989 (Olodum)

Tá Beleza (Terra Samba)

Flexa da Paixão(Banda Mel)

Minha preferida (Jammil)

Pura sintonia (cheiro de amor)

Soberano rei (Olodum)

Ginga de orixá(Olodum)

Manchete principal (Olodum)

Pode me esperar (Riachão e Dez compromissado)

Poeta Olodum (Olodum )

História da escrita(Olodum )

Química do amor (Afrodisíaco)

Cenário (Jaú pery)

Tiago Queiroz
Tiago Queiroz
Graduado em Comunicação/Jornalismo, e exerce as funções de Editor e Coordenador de Jornalismo do Portal NORDESTeuSOU

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